Mulheres que escrevem o próprio destino. Ou não.
- Gisele Fortes
- 15 de abr.
- 3 min de leitura
Março está terminando, levando com ele o mês da Mulher, mas não a urgência de refletirmos sobre os espaços que ocupamos, as vozes que ecoamos e as histórias que decidimos contar.

Para mim, como mulher e escritora, esse é um convite não apenas à celebração, mas também à resistência. E à escrita.
Comecei minha carreira literária depois dos 40. Em julho, completo 45. E, ao contrário do que muitos poderiam imaginar, sigo escrevendo com ainda mais intensidade, mais coragem e, sobretudo, mais clareza sobre o meu lugar no mundo e na literatura.
A maturidade, tão temida em tantos setores, é o que me fortalece como autora. Ela me permite criar personagens com alma, tramas com camadas e emoções que não se esgotam nas primeiras páginas.
Escrevo para o público jovem, especialmente o New Adult, e é justamente aí que os preconceitos surgem. Há quem estranhe. Quem questione.
Como se, ao passar dos 40, a mulher deixasse de amar intensamente, de sonhar com recomeços ou de viver descobertas. Como se a chama da juventude precisasse, por obrigação, apagar-se.
Mas a verdade é outra.
A mulher madura carrega uma riqueza narrativa que vem da vida vivida: das quedas, dos desvios de rota, das reinvenções.
Essa não é uma batalha individual. O caminho das mulheres na literatura sempre foi marcado por resistência. Séculos atrás, autoras como George Sand e as irmãs Brontë precisaram adotar pseudônimos masculinos para serem publicadas. Porque escrever era ousadia demais para uma mulher. Porque publicar, então, era quase inaceitável. Ainda assim, elas escreveram. Persistiram. E abriram as portas por onde hoje tantas de nós entram, embora os obstáculos ainda existam.
Hoje, dominamos prêmios, feiras, listas de mais vendidos. Mas o preconceito apenas mudou de forma. Se antes era o nome, agora é a idade, o gênero literário, a aparência, o público-alvo. Ainda escuto perguntas que jamais fariam a um escritor homem:
“Você ainda escreve para jovens?”“Não é tarde para começar?”“New Adult? Mas não é uma fase já superada pra você?”
Não, não é. Porque a literatura não tem prazo de validade. E nem a criatividade feminina. Escrever é um ato de permanência. De presença. De liberdade.
As mulheres que não têm a chance de escreverem seus destinos: a violência contra o feminino
Não posso deixar de lembrar daquelas mulheres que são silenciadas todos os dias. A cada 17 horas, uma mulher é morta em razão do gênero no Brasil. Em 75% dos casos, o agressor é alguém próximo. Em 70%, o próprio companheiro ou ex-companheiro. A violência doméstica, o feminicídio e o apagamento seguem escrevendo histórias que não escolhemos. Histórias que precisamos denunciar.
Frente a esse contraste brutal, o ato de escrever — e de ser lida — torna-se ainda mais político. E necessário. Quando mulheres escrevem, elas resistem. Quando publicam, desafiam. Quando são lidas, transformam.
Foi assim com Carolina Maria de Jesus que, com seu diário, nos deu um retrato cru da realidade das favelas. É assim com Conceição Evaristo, que cunhou a ideia da "escrevivência" para falar da experiência negra com profundidade e lirismo. Foi assim com Nísia Floresta, pioneira feminista brasileira no século XIX. E é assim com cada mulher que ousa escrever. E não como musa, mas, sim, como criadora.
A literatura escrita por mulheres é, mais do que nunca, um território de pluralidade. De vozes que ecoam do centro e das margens, do urbano e do interior, da juventude e da maturidade. Histórias que nascem de dores e delícias, de silêncios e gritos. Histórias que resistem. Que encantam. Que fazem pensar.
E é por isso que sigo. Porque ainda tenho muito o que contar. Porque muitas de nós ainda têm.
E você? Quais mulheres escritoras marcaram sua vida? Que histórias escritas por mulheres mudaram sua forma de ver o mundo?
Gisele Fortes
Gisele, teu texto é excelente para a reflexão de mulheres que querem mostrar sua arte e expressar o que vai no coração. Também comecei tardiamente a mostrar publicamente meus textos e poemas e nunca mais quero parar. Parabéns!